O “mercado” político para as mulheres

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Lá pelo início dos anos 2000 li um livro muito interessante chamado Megatendências para mulheres. Esse livro foi publicado em 1993 e é fruto da pesquisa de um casal de sociólogos que investigaram, como o nome já sugere, como as mulheres vem transformando a sociedade a partir de vários campos: negócios, política, religião, consumo, esportes, medicina, ciência e etc.

Um dos destaques dos autores que mais me chamou a atenção é o que eles chamaram de “estilo de liderança feminino”, que se caracteriza pela capacidade feminina de gerenciar equipes com base em empatia, escuta e colaboração. Segundo os autores, a resposta positiva a esse estilo em termos de produtividade nas empresas, já estava tornando-o um método a ser adotados por homens e mulheres, ou seja, a influência do estilo feminino nos negócios já estava se expandindo.

De lá pra cá, quase trinta anos depois, a presença das mulheres em todas as áreas da sociedade é significativa, embora a correlação de forças ainda esteja bastante desequilibrada em termos de paridade salarial, oportunidades de ascensão de carreira e proteção à integridade física e psicológica. O fato é que somos maioria, maioria da população, maioria do eleitorado, maioria nas universidades, mais ainda nos falta ultrapassar a “última fronteira”, a da política.

Falo na verdade da política institucional, dos espaços de poder que se acessam por vias eletivas pois, no que se refere aos espaços de decisão social, cargos políticos por indicação e conselhos, temos um número considerável de mulheres participando e se fazendo ouvir.

Mas por qual motivo não avançamos no mercado político na mesma proporção que avançamos no mercado (econômico)? A resposta mais fácil é que a política é machista, mas essa não é a resposta certa, ela é só mais uma cortina de fumaça que serve para “simplificar” o que não tem nada de simples.

Ao observar o cenário nos últimos anos, em especial dentro dos processos eleitorais, te digo que um fator de peso se chama “estratégia discursiva”. Os números não mentem, somos 52% da população e 53% do eleitorado, isso não é ser minoria pois, em tese, temos real poder de decisão, mas estatística e comportamento social não são consequência um do outro, uma coisa é sermos mais de 50% e outra é agirmos como mais de 50%.

Ao ouvirmos (e reproduzirmos) repetidamente que somos minoria e que a lei eleitoral garante uma “cota de 30% para mulheres”, entendemos que esse espaço é um privilégio e que devemos ser gratas porque alguém ou uma entidade indefinida nos agraciou com essa fatia representativa e, infelizmente acabamos agindo de acordo.

Acontece que ninguém dá nada a ninguém em política, muito menos poder. Portanto o espaço das mulheres deve ser conquistado, tal como foi nos espaços de que fala o livro e não canso de repetir, a lei NÃO fala em cota para mulheres, cito “cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo” (Lei 9.504/97). Isso é tão absurdamente arraigado no inconsciente coletivo que você acha esse termo “cota de 30% para mulheres” no próprio site do TSE[1] (confira na nota de rodapé).

Embora tenha havido mais um avanço na legislação com o fim das coligações proporcionais (as cotas mínima e máxima de ambos os sexos tem que ser respeitadas por partido e não mais pela coligação) aumentando assim a obrigatoriedade do número de mulheres, é preciso lembrar que para chegarmos a 30%, 40%, 50%, 60% e até o limite de 70% precisamos de educação política para a cidadania e mais ainda, precisamos entender que para entrar no “mercado político” precisamos de conhecimento, preparação e de um plano, sim um plano. É preciso entender o cargo representativo como uma carreira, você não se candidata a uma vaga de emprego sem ter o mínimo de qualificação não é mesmo? Por que então deve se apresentar ao eleitor como mera pessoa interessada e com boa vontade?

O preparo e o conhecimento fez com que as mulheres ascendessem no mercado e se estabelecessem e, com certeza, esse também é o caminho para a ascensão no mercado político.

Você não quer ser mais uma não é?

[1] https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2019/Marco/cota-de-30-para-mulheres-nas-eleicoes-proporcionais-devera-ser-cumprida-por-cada-partido-em-2020

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